Sunday, May 22, 2005

Alívio

Ele não sabia, nem tinha como saber, pois há muito não via um relógio, quanto mais um calendário, mas pouco depois das duas horas da tarde do dia 21 de maio de 2005, um sábado sombrio e cinza como todos os outros dias, o menino maltrapilho respirou fundo e tomou a decisão mais difícil de toda a sua vida. Ele se levantou, abriu os braços, inspirou profundamente o ar pesado, e rasgou os trapos velhos que vestia. Com pouco esforço, destruiu o que restava da casa onde morava, e, como se fosse um milagre, viu no horizonte, ao longe, banhada por improváveis raios de sol alaranjados, a silhueta de uma caravana. A comitiva composta por quatorze carroças seguia a linha do horizonte lentamente, e parecia que os homens e animais que a compunham estavam se arrastando, como que se seu destino fosse incerto. Mesmo assim, o menino desgarrado achou aquilo tudo um tanto otimista, e misturando suas lágrimas com o suor que escorria de sua testa e de seus cabelos desalinhados, nu e livre pela primeira vez, correu ao encontro daquela desconhecida caravana, deixando a cidade rugindo atrás de si, cada vez mais longe, cada vez mais curvada. Para sempre.

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